sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

 

 

 

 

PROCESSO DE VALIDAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA DO MASLACH BURNOUT INVENTORY: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO

 

Alexandre Luís Gonzaga (UEMS)[1]

 


 

Resumo: A síndrome de burnout é um fenômeno que afeta o trabalhador moderno nas mais diversas áreas de atuação, e pode ser incapacitante. Neste estudo analisamos um conhecido instrumento de avaliação desta síndrome e o submetemos a um processo de validação estatística em língua portuguesa com uso de análise fatorial. Um processo de validação é necessário para saber um intrumento de pesquisa se comporta em outra língua domesmo modo que na sua língua original. O Maslach Burnout Inventory é um instrumento baseado em escalas de Likert e prevê originalmente três fatores a saber: exaustão emocional; despersonalização; reduzida realização pessoal. A matriz foi rotada sem limitação de fatores pelo método de rotação Equamax em SPSS 10.0, a análise resultou em 5 fatores com eingenvalues acima de 1,0 pelo critério de Kaiser sendo 4 fatores com alta confiabilidade baseado no teste alfa de Cronbach.

 

Palavras-chave: síndrome de burnout, instrumento de análise, motivação no trabalho

 

Abstract: The burnout syndrome is a phenomenon that affects the modern worker in the most diverse areas of activity, and can be disabling. In this study, we analyzed a well-known instrument for assessing this syndrome and submitted a process of statistical validation in Portuguese using factor analysis. A validation process is necessary to find out how a research tool is compatible with another home language than its original language. The Maslach Burnout Inventory is an instrument based on Likert variations and estimated three factors, namely: emotional exhaustion; depersonalization; reduced personal fulfillment. A matrix was rotated without the limitation of factors by the Equamax rotation method in SPSS 10.0, an analysis resulting from 5 factors with values above 1.0 by the Kaiser criterion, being 4 factors with high frequency based on Cronbach's alpha test.

 

Keyword: burnout syndrome, analysis tool, motivation in the work


 

Este texto é um excerto de nossa dissertação onde tratamos de modo ampliado e detalhado o escopo abordado aqui.

O ponto de partida de toda a discussão apresentada neste trabalho tem como referência a síndrome de burnout decorrente do stress no ambiente de trabalho. Portanto, este trabalho apresenta conceitos de stress e burnout e o processo de validação de um instrumento largamente usado na psicologia do trabalho para detectar esta síndrome. A validação se dará com o uso de métodos estatísticos robustos para possibilitar seu uso tanto em Administração como em Psicologia do Trabalho

A primeira tentativa de descrever o burnout foi feita por Freudenberger (apud Maslach, 1986; Almer & Kaplan, 2002; Söderfeldt, 1997) que foi quem introduziu o conceito descrevendo reações adversas em pessoas que trabalhavam em serviços de saúde. O autor era um psicólogo clínico, e sua abordagem para o burnout era voltada à estudos clínicos.

A abordagem clínica de Freudenberger é diferente quando comparada à segunda tentativa de Maslach. Ela pode ser reconhecida como a pessoa que trouxe o burnout para a Academia e desempenhou um importante papel na expansão das pesquisas em torno deste fenômeno. A autora desenvolveu o instrumento mais amplamente usado para medir o burnout, o Maslach Burnout Inventory, MBI, onde o burnout é concebido como uma síndrome com três diferentes, embora relacionados, aspectos. Maslach tem claramente uma visão multidimensional do burnout.

O autor se baseou nas suas próprias pesquisas e experiência pessoais (Söderfeldt, 1997) e nas suas observações diárias de pessoas com sinais de burnout, detalhou efeitos gerais do fenômeno. Os sinais podem ser ao mesmo tempo físicos e comportamentais variando de pessoa para pessoa. Freudenberger considerou os seguintes sintomas como sinais de burnout: sentimentos de exaustão e fadiga, inabilidade para deixar pequenos problemas para depois, freqüentes dores de cabeça, gastrites, perda de peso e sono, depressão.

A pessoa potencialmente sob risco de burnout é descrita por Söderfeldt (1997) como alguém com dificuldades de segurar seus sentimentos e em função disto não se envolve com seu trabalho apresentando, assim, baixo desempenho, tendo também dificuldade de relacionamento social e familiar.

De acordo com Maslach, seu interesse no burnout surgiu em pesquisas com reações emocionais. A autora estudou como policiais e trabalhadores dos setores de emergência de hospitais lidavam com seus sentimentos. Surgiram três aspectos conceituais a partir destes estudos, “indiferença” (detached concern) e “insensibilidade ou embrutecimento desumanização para auto-defesa”. refere-se ao ideal da profissão médica de não misturar compaixão e distância emocional; “desumanização” refere-se ao processo de proteger-se dos sentimentos alheios de opressão, respondendo a outras pessoas mais como sendo objetos que como pessoas (Söderfeldt, 1997).

O terceiro aspecto está relacionado à auto-avaliação de competência profissional. A experiência de desordem ou agitação emocional era freqüentemente interpretado como um fracasso profissional. Muitos dos trabalhadores pesquisados por Maslach não se sentiam preparados pelo treinamento formal a lidar com os aspectos emocionais do trabalho e seus efeitos sobre eles.

A partir daí Maslach elaborou um instrumento de pesquisa baseado em escalas de Likert com a intenção de medir ou quantificar o quanto uma atitude negativa pode impactar trabalhador e trabalho, surge, assim, o Maslach Burnout Inventory.

Atitude negativa em relação ao trabalho resulta em sentimentos de baixa realização profissional e performance inadequada; das três dimensões de estudo do burnout, baixa realização pessoal é a dimensão que menos recebeu suporte empírico (Armer & Kaplan, 2002).

A hipotética relação entre os três componentes é que a exaustão emocional é uma resposta a estressores emocionais no trabalho e que, contudo é a primeira fase do burnout. O indivíduo pode tentar lidar com os estressores se afastando deles, desenvolvendo resposta despersonalizada às pessoas. Quando a despersonalização ocorre, o indivíduo tende a avaliar-se menos positivamente em termos de realização de um bom trabalho. Assim, a exaustão emocional deve ser um preditor da despersonalização, que o é do nível de realização pessoal. (Maslach & Jackson, 1982)

Os trabalhos de Freudenberger e Maslach colocam o burnout como fruto de situações de trabalho, notadamente nos profissionais que têm como objeto de trabalho o contato com outras pessoas. O burnout, então seria a resposta emocional a situações de stress crônico em função de relações com pessoas em situação de trabalho, e, no entanto em função de diferentes obstáculos, não consegue desenvolvimento profissional, dedicação à profissão e não alcançam o retorno desejado (Limongi França & Rodrigues, 1999).

A preocupação com a saúde do trabalhador, neste contexto, relaciona-se diretamente com sua produtividade na empresa. Ou seja, para se atingir plena produtividade e qualidade é preciso ter indivíduos saudáveis e qualificados. A organização, por sua vez, atua de forma a pressionar o indivíduo, levando-o a estados como os de insatisfação. Dentre esses estados, encontra-se a fadiga, o stress e a síndrome de burnout. Em uma perspectiva interacionista que leve em consideração um ajuste dinâmico entre pessoal, local de trabalho e organização, sugere-se que nem sempre esse ajuste é adequado, onde surgiria tanto motivação quanto predisposição ao stress.

O mesmo trabalho que motiva e gratifica, quando realizado com plena atenção e perspicácia, exige esforço, concentração e raciocínio, implica em desgaste físico ou mental, lembra-nos Kanaane (1994). Nesse sentido nota-se uma relação intrínseca entre este desgaste e a qualidade do trabalho.

Aubert em seu artigo “A Neurose Profissional” (in Chanlat et. al. 1996 vol. 2) descreve o burnout como o que denomina “doença da idealização” e acrescenta que este é

... o custo elevado do sucesso, decorrente da luta constante que mantemos para satisfazer os ideais de excelência que caracterizam nossa sociedade e que algumas empresas encarnam com particular acuidade (ibidem, 1996:187).

 

A necessidade crescente de envidar esforços na busca de um desempenho cada vez melhor e de tender para um maior sucesso profissional, estão na origem desse fenômeno, o indivíduo entra numa espiral de realizações onde é obrigado a correr cada vez mais depressa em um contexto onde as mudanças ocorrem tão rapidamente que não resta nada estável suficiente para dar a segurança necessária para este indivíduo parar e renovar suas energias.

Esta espiral de realizações provoca um efeito colateral, uma resposta do indivíduo que começa com um stress,  que num primeiro momento não é de todo ruim. Este processo deve ser compreendido melhor, nesse sentido expoe-se a seguir o método da pesquisa.

Uma pesquisa do tipo Survey é composta por um questionário aplicado a amostras de populações, no caso desta pesquisa um questionário foi aplicado a uma amostra de funcionários de uma instituição financeira localizada na Cidade de São Paulo. Para caracterizar-se a pesquisa como sendo do tipo Survey, alguns procedimentos são necessários como, por exemplo, as respostas serem codificadas de forma padronizada e registradas de forma quantitativa. Os registros são submetidos a uma análise agregada, para fornecer descrições dos elementos da amostra e determinar correlações entre diferentes respostas. As conclusões são então, generalizadas para a população toda. (Babbie 1999).

Sucintamente pode-se dizer que a pesquisa efetuada aqui, devido ao problema enfocado, pode ser classificado como quantitativa, com resultados obtidos através de um levantamento amostral (survey), com escalas de atitudes de Likert, e dados analisados segundo métodos estatísticos de análise multivariada.

A amostra é composta por 120 elementos pertencentes ao sexo masculino (64,9%) e 65 elementos pertencentes ao sexo feminino (35,1%), a constituição do grupo macro não apresenta equilíbrio pois o número de sujeitos do sexo masculino é quase duas vezes o de sujeitos do sexo feminino.

Quanto à faixa etária dos respondentes, a maior incidência encontrada foi “entre 30 e 40 anos” com 35,1%, seguida da faixa etária “acima de 40 anos”, com 33%. Vale ressaltar, conforme apresentado na referida tabela, que não houve grupo com maior representação para “faixa etária”, a distribuição apresentou-se bastante homogênea

A distribuição por grau de escolaridade foi: 30,6% até o nível médio; 24,7% com superior incompleto; 44,3% com grau superior completo; 0,4% com pós-graduação.

Um dos mais poderosos métodos para reduzir a complexidade de variáveis a maior simplicidade é a análise fatorial para Kerlinger (1999). É um método analítico para determinar o número e natureza de variáveis subjacentes a um grande número de variáveis (idem 1999, p. 203). A presente análise teve como objetivo a identificação da estrutura fatorial das respostas colhidas na amostra do estudo proposto para comparação com a estrutura fatorial descrita nos estudo de Barnet et al. (1999), Maslach et al. (1986) e Gil-Monte (2002)

O instrumento foi analisado segundo o método de Análise Funcional de intercorrelações – matriz rotada de correlações – chamado  Equamax com normalização de Kaiser. Esse método foi escolhido porque o número de variáveis obtido terá carga fatorial maior e o número de fatores será minimizado, isto é, a reunião de proposições segundo a mesma tendência de correlação estatística para se fazer julgamentos de aspectos que têm a mesma relevância frente ao conjunto de assertivas. Com essa análise pode-se separar e agregar elementos muitas vezes indistintos, obtendo uma visão integral das concepções prévias dos respondentes.

Foram também realizados testes para confirmar se o método de análise fatorial seria adequado ou não, para não usa-lo apenas por simples sugestão.

O teste Kolmogorov-Smirnov verifica se os dados se comportam como uma distribuição normal ou de Gauss, ou seja, avalia-se a aderência dos dados àquele tipo de distribuição. O resultado mostrou que o valor da significância (p) para todas as variáveis é menor que 0,0001 (p< 0,0001) de acordo com os testes de distribuição normal, distribuição uniforme e distribuição exponencial.

Estes resultados indicam que os dados da amostra não podem ser considerados normais e assim deve-se tratá-los com métodos não-paramétricos (SPSS, 1999). Entretanto, no teste Poisson a significância permaneceu abaixo de 0,0001 somente em três variáveis, nestas condições os testes complementares de Kaiser-Mayer-Olkin (KMO) e o de esfericidade de Bartlett, para determinar se o método de análise fatorial pode ou não ser utilizado, são indicados (COOPER e SCHINDLER, 2003).

Utilizou-se o software SPSSâ (Statistical Package for the Social Sciences) Versão 10.0 para efetuar todos os testes descritos.

O Teste Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) indica a medida de adequação dos dados, é um teste que examina o ajuste de dados, tomando todas as variáveis simultaneamente. Quando as correlações parciais forem muito pequenas, o KMO terá valor próximo a 1 e indicará a perfeita adequação dos dados para a análise fatorial (Pereira, 2001), a amostra obteve 0,865 como valor de adequação. 

Outro teste que precede a análise fatorial, com objetivo de testar a correlação entre as variáveis é o Bartlett Test os Sphericity ou Esfericidade de Bartlett, que testa a hipótese de que a matriz de correlação seja uma matriz identidade (diagonal igual a 1 e todas as outras medidas iguais a zero), ou seja, que não há correlação entre as variáveis. Ambos os testes indicam qual é o grau de suscetibilidade ou o ajuste dos dados à análise fatorial, isto é, qual é o nível de confiança que se pode esperar dos dados quando do seu tratamento pelo método multivariado de análise fatorial, e assim seja empregada com sucesso (Hair et al, 1998).

O teste Chi-quadrado (c2) pode ser usado para avaliar a relação entre duas variáveis qualitativas. Este teste é um teste não paramétrico, que é muito útil, pois não precisa da suposição de normalidade das variáveis para analisar o grau de associação entre as duas variáveis, porém este teste é menos poderoso que o teste paramétrico. O teste chi-quadrado não permite concluir como se dá a relação entre as variáveis, uma vez que ele testa apenas a hipótese geral de que duas variáveis são independentes

Apoiado nos resultados do teste geral de adequação da amostra, KMO = 0,865 (valores na casa dos 0,80 indicam boa adequação dos dados à análise fatorial, segundo Pereira, 2001), e no resultado do teste de esfericidade de Bartlett (Chi-quadrado = 1582,108)  e significância (sig. < 0,0001) se procedeu a análise de componente principal e confirmador de fatores com iterações e rotação equamax.

A rotação ortogonal Equamax permitiu a redução das variáveis ou de fatores. Buscou-se uma seleção de cargas fatoriais mais significativas, assim, escolheu-se a rotação com valores acima de 0,500 (corte das cargas fatoriais) que se mostra adequado, pois a literatura sugere valores acima de 0,300 (Kerlinger, 1980).

 

     Tabela 1: Matriz Rotada dos Componentes

 

 

 

1

2

3

4

5

 

2- consumido

,811

 

 

 

 

 

1- drenado

,787

 

 

 

 

 

8- esgotado

,776

 

 

 

 

 

3- fatigado

,740

 

 

 

 

 

14- trabalhando demais

,686

 

 

 

 

 

20- baterias no final

,670

 

 

 

 

 

13- frustrado

 

 

 

 

 

 

5- trato impessoal

 

,754

 

 

 

 

6- desgastante

 

,703

 

 

 

 

16- estressado

 

,682

 

 

 

 

18- exaurido

 

-,652

 

 

 

 

12- animado

 

 

,813

 

 

 

19- realização no trabalho

 

 

,809

 

 

 

9- influência positiva

 

 

,563

 

 

 

17- boa atmosfera com clientes

 

 

 

,667

 

 

7- trato eficaz

 

 

 

,617

 

 

21- mantendo a calma

 

 

 

,609

 

 

4- entender o cliente

 

 

 

,607

 

 

15- interesse pelo cliente

 

 

 

-,509

 

 

10- insensível com pessoas

 

 

 

 

,804

 

11- endurecimento emocional

 

 

 

 

,721

 

22- clientes culpam-no

 

 

 

 

,510

 

Fonte: relatório do SPSS.

Extraction Method: Principal Component Analysis.

Rotation Method: Equamax with Kaiser Normalization. A  Rotation converged in 8 iterations

 

Deve-se atentar para os valores das variâncias obtidos na análise fatorial, estes mostram que há cinco fatores e que o primeiro deles explica aproximadamente 29,26% dos dados da amostra, sendo de maior importância para a explicação dos dados. Adotou-se o critério de Kaiser onde foram selecionados os fatores cujos “eigenvalues” são maiores que 1. Um sexto fator tinha um “eigenvalue” muito próximo de 1 (0,958), todavia optou-se pela eliminação do mesmo uma vez que estava fora do limite de aceitação previsto no critério.

Os fatores Despersonalização e Realização Pessoal, previstos originalmente para o instrumento desdobraram-se.

A distribuição prevista por Maslach & Jackson é a seguinte:

Esgotamento Emocional: 1,2,3,6,8,13,14,16,20;

Despersonalização: 4,7,9,12,17,18,19,21;

Realização Pessoal: 5,10,11,15,22.

Assim, com uma nova distribuição, fez-se necessário também a re-interpretação dos fatores extraídos.

A variância explicada é a medida da capacidade que um Fator tem de representar a variação total das variáveis originais e é dado como uma proporção. Cada variável tem com cada Fator uma correlação que mede a força com que esta variável está ligada a este Fator. A esta medida dá-se o nome de Carga Fatorial. Para que a variável seja considerada pertencente a um determinado Fator e não a outro, o critério é arbitrário, entretanto, a maioria dos trabalhos utiliza como critério valores de cargas fatoriais acima de 0,300.

A análise de variância permite concluir acerca da igualdade das médias de cada fator através da comparação da variação entre amostras e a variação residual. Neste estudo, os sujeitos são agrupados pela variância de suas respostas assim construindo os fatores de análise

 

   Tabela 2 – Total de Variâncias Explicadas pelo método de Análise do Componente Principal

 

Initial Eigenvalues

 

Total da Variância explicada

 

Componente

Total

% de Variância

Cumulativa %

 

1

6,439

29,268

29,268

 

2

2,588

11,763

41,031

 

3

1,514

6,884

47,915

 

4

1,409

6,403

54,318

 

5

1,118

5,081

59,399

 

  Fonte: Relatório do SPSS

Como visto na Tabela 9, a rotação Equamax não confirmou os 3 fatores previstos por Maslach. Assim, os fatores identificados foram assim denominados com suas respectivas questões:

Fator 1 = stress no trabalho – 1,2,3,8,14,20

Fator 2 = relacionamento interpessoal – 5,6,16,18

Fator 3 = satisfação no trabalho – 9,12,19

Fator 4 = interesse no atendimento ao cliente – 4,7,15,17,21

Fator 5 = apatia no trabalho – 10,11,22

A confiabilidade do instrumento foi  medida através do alfa de Cronbach que é a medida do quadrado da correlação entre o escore observado e o escore real.

Inicialmente interpretamos a consistência interna por meio deste coeficiente onde obtivemos resultados satisfatórios. O valor de alfa de Cronbach foi acima de 0,80  e está dentro dos valores aceitáveis segundo sugestões de Nunnaly (1978) e Neto (2001).

O valor de alfa de Cronbach dos itens mostra que não é necessário eliminar nenhum item uma vez que não ocorrerá melhora do valor de alfa obtido (0,8014). O valor obtido supera os valores mínimos descritos por Nunnaly (1978). Segundo Neto et. al. (2001) o teste de confiabilidade é imperativo e mede o desempenho de um instrumento em uma dada população evitando o agrupamento de questões aparentemente relevantes. Ainda segundo Freitas et all. (2000) a validade e a confiabilidade são requisitos essenciais para a medição do instrumento.

Considerando-se que há apenas dois fatores com coeficientes alfa de Cronbach com valores inferiores a 0,7, (fatores 3 e 5, respectivamente com coeficientes de 0,6334 com alfa padronizado em 0,6413 e 0,5852 com alfa padronizado em 0,5857), pode-se considerar que a consistência interna dos dados obtidos com o uso do MBI como instrumento é satisfatória.

A análise discriminante nos permite investigar se subconjuntos da amostra, categorizados em grupos pré-definidos a partir de alguma característica ou condição específica dos respondentes, apresentam diferenciações significantes. Os critérios para definição dos grupos a serem estudados foram sugeridos segundo crença do pesquisador  sobre características que poderiam influenciar o comportamento da amostra.

Na análise discriminante não foram encontrados grupos que se ressaltassem em relação à amostra total. Se por um lado isto pode significar que as políticas de Recursos Humanos são eficientes o bastante para agirem sobre os funcionários de maneira a nivelá-los, por outro lado significa que a amostra não foi grande o suficiente para que se pudesse quantificar as diferenças entre subgrupos.

 

 

Análise dos resultados

 

O primeiro fator a ser analisado, stress no trabalho, é também o mais fortemente apontado nas extrações fatoriais efetuadas, com eigenvalue de 6,445 explicando sozinho 29,29% da variância apresentada na amostra

O Relacionamento Interpessoal – Fator 2Este fator descreve atitudes comportamentais dos funcionários em relação aos colegas e clientes. É importante notar que este fator tem relação direta com a interação no ambiente de trabalho e explicou 11,76% da variância total observada na amostra

Assim entendido, que o stress seja provavelmente conseqüência da natureza da atividade, voltamos nossa atenção para a alta carga fatorial apresentada neste fator. Os funcionários não estavam, ao menos no momento em que as respostas foram colhidas, reagindo bem à situação diária. O insucesso em superar as situações que se apresentam no ambiente de trabalho diariamente se configura como uma situação de perigo ao controle do ambiente.

Nas organizações, trabalho e indivíduo são estreitamente interligados, a ponto de o sucesso competitivo de uma organização apoiar-se na integração destes dois elementos com a efetividade do gerenciamento dos relacionamentos entre ambos. 

Assim, gerentes precisam conhecer vários fatores que afetam o desempenho do trabalhador quando em local de trabalho.

A proposta desta pesquisa não foi a de identificar os fatores que afetam o trabalho, todavia, o fator ora identificado, Relacionamento Interpessoal, visa avaliar a qualidade dos relacionamentos dentro da organização num determinado momento. De acordo com Wagner & Hollenbeck (1995) existem quatro tipos de interações de interdependência, a agrupada, a sequencial, a recíproca e a compreensiva. Nesse sentido, identificar o tipo de relacionamento estabelecido entre os trabalhadores pode oferecer algum impacto positivo ou não nos resultados da organização.

Muitos são os trabalhos escritos na área da motivação organizacional, por isso não se pretende aqui discutir mais sobre esse assunto, todavia, a rotação ortogonal para redução de fatores reagrupou as respostas obtidas de modo a separar um grupo de questões ligadas indiretamente à motivação. Este item relaciona-se diretamente com a satisfação no trabalho, relaciona-se com o modo favorável ou desfavorável com que os funcionários consideram seu trabalho diário.

As variâncias das assertivas mostraram que: a) o funcionário está bastante animado com seu trabalho; b) o trabalho os realiza profissionalmente; c) a influência positiva através do trabalho não é muito clara entre os funcionários.

Na verdade existe um limite muito tênue que permite distinguir a diferença entre o estar animado e este realizar profissionalmente o funcionário, assim pode-se deduzir que os funcionários têm sua necessidade profissional apropriadamente satisfeita. Entretanto, pode-se deduzir também que estes mesmos funcionários não vêem seu trabalho com tendo conteúdo positivo suficiente para que possam influenciar positivamente outras pessoas.

Percebe-se claramente uma visão herzberguiana sobre o trabalho, os fatores que geram satisfação (quando estão bem) e os fatores que geram insatisfação (quando estão mal) são distintos e seus opostos não constituem necessariamente ponto comum. Embora se esteja analisando o fator “satisfação no trabalho” especificamente, não se deve esquecer da contextualização em que está inserido, ou seja, não podemos perder de vista os demais fatores. Nesse sentido, o primeiro fator a ser analisado mostra inequivocamente existirem causas intrínsecas ao trabalho que desgastam fortemente o funcionário estressando-o por provável desajuste.

Bergamini nos diz que as necessidades não satisfeitas devem ser consideradas oportunidades potenciais de desajustamento, sendo a “necessidade caracterizada como uma situação ou condição de não realização individual e que leva a conseqüências indesejáveis” (p. 139, 1997).

Satisfazer a uma necessidade não só é condição básica para evitar conseqüências de provável desajustamento, como também representa um meio de neutralizar a discrepância entre a expectativa da satisfação e o estado real em que a pessoa se encontra.

Os levantamentos mostram não existir diferenciação quanto às várias classificações efetuadas entre os funcionários, como observado na análise discriminante, assim, a pessoa a que se faz referência pode ser qualquer funcionário.

O Atendimento ao Cliente, fator 4, As variáveis deste fator, conforme mostradas na tabela 34, mostram uma característica marcante, os funcionários se vêem prestando um bom atendimento ao cliente sem que isso lhes faça se interessar pelo que acontece com seus clientes.

Observa-se uma falta de preocupação do Banco em realmente atender as necessidades do cliente e assim destacar o serviço pessoal de atendimento ao cliente como uma vantagem competitiva, defendida por Albrecht (1992) no sentido de a empresa voltar-se totalmente para o cliente. 

Todavia, alguns os Bancos apresentam o mesmo modus operandi e têm o mesmo comportamento, e uma maneira geral o consumidor acaba não tendo escolha, especialmente aqueles que gostariam de um atendimento mais pessoal ou personalizado e respostas mais rápidas aos seus problemas ou dificuldades sem que esse atendimento dependesse de seu saldo em conta.

Conforme observado, o fator “atendimento ao cliente” explicou 11,76% da variância da amostra sendo de grande importância à interpretação dos resultados.

O quinto fator, A apatia é uma atitude estreitamente relacionada com a despersonalização descrita por Maslach. São atitudes de auto-análise, é o que o funcionário percebe em si como resultado da interação com o trabalho, enquanto que o fator 2 discute sua capacidade de se inter-relacionar com outras pessoas

Este fator é explicitamente focado no próprio funcionário e, nesse sentido, também representa um desdobramento do fator 1. É claramente uma atitude negativa, sendo, entretanto, diferente de impessoalidade de ação na organização, tal como seria a burocracia Weberiana, onde o indivíduo é neutro, estritamente racional e, nesse sentido, despersonalizado.

Argyris nos sugere que a busca contínua da racionalidade pela organização se processualiza de forma tão estruturada que causa ao indivíduo uma “incongruência básica” entre a personalidade do indivíduo e a organização formal. Esta incongruência básica aparece à medida que a organização obriga o indivíduo a se submeter a seus procedimentos, rotinas, regras, tornando-o submisso, fazendo-o atuar sob controle e, portanto, com pouca margem de liberdade e ação. Este tipo de conflito se agrava com o crescer do nível intelectual do indivíduo,  (Argyris, 1969 ).

A reação do indivíduo se faz numa linha adaptativa: o trabalhador precisa do trabalho para sobreviver, não pode mudar a maneira de ser da organização, resta somente a adaptação.

A adaptação ocorre até o ponto em que o conflito que obriga o trabalhador à adaptação também o leva à frustração. Para Argyris este processo gera mecanismos de defesa, cria uma contracultura. Ao nível pessoal, o autor diz que o trabalhador poderá desenvolver apatia no trabalho, desinteresse e até sabotagem.

 

Considerações finais

 

Neste estudo, buscou-se validar um instrumento de análise do campo da Psicologia do Trabalho na área da Administração de Empresas valendo-se da interdisciplinaridade do assunto. Tal instrumento, constituído de uma escala de atitudes, foi aplicado em uma amostra não probabilística, mas estatisticamente adequada, de funcionários de um Banco Federal e os dados coletados, foram analisados segundo métodos estatísticos multivariados de análise fatorial.

Observou-se que, pela análise dos resultados, deu-se como dimensão mais importante o Stress no trabalho, que corresponde a 29,27% da variância da amostra, o que implicou numa análise mais detida do tema.

o objetivo da análise fatorial é a análise de dimensionalidade do instrumento. Os níveis altos ou baixos das respostas coletadas são irrelevantes para as dimensões. Contudo, essas dimensões estão subjacentes, chamadas de fatores, e não são observadas numa análise a priori,  mas que presumivelmente explicam resultados obtidos. Nesse sentido, segundo Kerlinger (1980),um fator é um constructo, uma entidade hipotética, uma variável não observada mas que tem a capacidade de explicar a variância de variáveis observadas

Conforme pode ser constatado em Maslach & Jackson (1986), não está claro qual tipo de análise fatorial foi usado no desenvolvimento do MBI. Nós acreditamos que foi usado o método da análise chamado Máxima Verossimilhança (Maximum Likelihood), porque este método junta todos os valores de variância muito semelhantes, ao mesmo tempo, os autores podem ter optado por forçar a matriz à três fatores.

Como apontados anteriormente, os 22 itens do MBI foram analisados aqui pelo método de análise do componente principal com rotação Equamax. O número de fatores foi determinado pelo critério de Kaiser; o alfa de Cronbach foi calculado para o instrumento como um todo e por fator em análises separadas. Este foi o método que mais se adequou à nossa expectativa por que conseguiu explicar a maior porcentagem da variância apresentada. Ressaltamos que tentamos reproduzir alguns métodos propostos, todavia os modelos apresentaram-se inadequados à amostra utilizada neste trabalho.

O Objetivo principal deste estudo foi alcançado, a validação do MBI em língua portuguesa foi bem sucedida, ou seja, o instrumento está validado, no entanto as cargas fatoriais mostraram que existem outros fatores além dos relacionados por Maslach & Jackson (1986); nesse sentido, aqui reside a maior contribuição deste estudo.

Está criada uma matriz para estudos posteriores em língua portuguesa; a matriz a que se faz referência é aquela constante na Tabela 9, onde se pode observar a extração dos fatores e suas respectivas cargas. Ressaltamos que o corte foi efetuado com um valor 0,500, bem acima dos 0,300 sugeridos na literatura. A importância deste alto valor de corte está em notar a alta contribuição de cada assertiva na construção dos fatores.

Esperamos ter contribuído um pouco para o estudo e a compreensão desta síndrome.

 

 

 

Referências bibliográficas:

 

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BABBIE, Earl. Métodos de pesquisa de survey. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999

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[1] Professor Doutor na área de Comunicação Empresarial e Língua Portuguesa, atua como substituto na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. E-mail: alexandre_gonzaga@hotmail.com

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