NEOLOGISMOS EM PERIÓDICOS DE HUMOR PUBLICADOS
ENTRE 1887 E 1909
Alexandre Luís Gonzaga
RESUMO:
A imprensa humorística e satírica produziu muitos neologismos com a finalidade
de causar efeitos de sentido de humor muitas vezes apoiando-se em deslizamentos
de sentido e dúbia interpretação. Este tipo de publicação tem características
distintas peculiares ao universo cômico, com intenções diversas, desde a
crítica social genérica passando pela crítica a pessoas específicas como
políticos e governantes, até a crítica aos costumes da pessoa comum. A sátira e
o deboche era o procedimento comum destes jornais. Buscamos consultar a
hemeroteca digital da Biblioteca Nacional como fonte. Neste estudo analisou-se
uma amostra de periódicos de humor publicados entre 1887 e 1909 disponíveis
para consulta. Os termos selecionados foram agrupados em um glossário.
PALAVRAS-CHAVE:
Arcaísmos, neologismos, glossário,
A imprensa humorística e satírica tem
uma produção bastante profícua desde o século XIX no Brasil contando com muitos
títulos publicados. Este tipo de publicação tem características distintas
peculiares ao universo cômico, com intenções diversas, desde a crítica social
genérica passando pela crítica a pessoas específicas como políticos e
governantes, até a crítica aos costumes da pessoa comum. A sátira e o deboche
era o procedimento comum destes jornais.
Neste artigo trabalhamos fatos da ordem
do léxico, especificamente de lexias sobre as quais se apoiam os sentidos que
dão efeito de humor. Assim, optamos por elaborar um glossário de itens lexicais
constantes no corpus, e verificar com
o uso de dicionários os sentidos atribuídos às lexias coletadas. Assim,
procuramos inicialmente discorrer sobre a abordagem teórica que embasa nosso
estudo como questões que envolvem a constituição de um glossário, os diversos
dicionários consultados, neologismos e estrangeirismos e o humor na língua.
Um traço cultural marcante na cultura
brasileira é a diversidade e a heterogeneidade, até como sinônimos uma da
outra.
Como fenômeno, o estrangeirismo é
observável na língua, portanto linguístico, se baseia no uso de vocábulos
estrangeiros, expressões ou até frases inteiras adaptadas à língua nacional
como substituição ou acréscimo de lexias. Como o léxico brasileiro é
basicamente de origem latina, se vale de empréstimos de outras línguas para
expressar ideias ou conceitos novos. A influência francesa foi marcante até a
primeira metade do século XX, cedendo espaço para a língua inglesa cuja
influência já se podia perceber no final do século XIX principalmente via poder
econômico inglês. Muitos empréstimos entraram e permaneceram no léxico de tal
modo que não são mais sentidos como estrangeirismo, pois que passaram por um
processo de aportuguesamento lexical, sofreram modificações em níveis fonético,
morfológico e sintático para se acomodarem à língua nativa.
O estrangeirismo é um fato da língua que
tem presença constante, pois que devemos considerar a intersecção dos processos
culturais com os processos linguísticos. O período compreendido entre o final
do século XIX e início do século XX assistiu a imigração em ondas após a
abolição do regime escravista. A necessidade de mão de obra para as lavouras
foi o principal motivo da entrada de estrangeiros no país naquele período, mas
não o único. A importação de objetos e a adoção de costumes estrangeiros também
contribuíram grandemente para a entrada de estrangeirismos no léxico nacional.
Na elaboração de nosso glossário, percebeu-se a presença de diversos
estrangeirismos ligados a manifestações culturais e esportivas, como o carnaval
com termos como pierrots, arlequins e colombinas, e o futebol com termos como goal, match, footballers, entre outros.
Considerando certos aspectos
lexicográficos, podemos dizer nas palavras de Haensch (1982, apud BARBOSA, p. 23,
2001) que “los términos ‘dicionario’, ‘glosario’, ‘vocabulario’, de uso
corriente en la actualidad, tenían en la antiguidad um significado distinto”, e
que se alterou significativamente quando as diferenças da língua vulgar em
relação ao latim se aprofundaram em todo o mundo romanizado. Bassetto (2001)
lembra a origem dos glossários como anotações entre linhas ou mesmo nas margens
de textos antigos com o objetivo de esclarecer momentos mais complexos do
texto. Barbosa (2001) ressalta que as glosas aparecem em textos antigos em
ordem que pode ser alfabética ou sistemática, para explicar o significado de
determinadas lexias. Como apontamentos para explicar o significado de uma
palavra, as glosas aparecem muitas vezes em notas de rodapé, mas ao aparecerem
no final de um capítulo ou mesmo no final de uma obra as glosas coligidas ao
longo do texto formam então um glossário. Contemporaneamente o termo
‘glossário’ é utilizado em obras lexicográficas para explicar lexias em textos dialetais
ou até de um autor específico. Os termos ‘vocabulário’ e ‘glossário’ também podem
ser usados quando se tem a necessidade de explicar lexias relacionadas a áreas
de conhecimento específico, técnicas ou acepções distintas ao final de um texto
que pode ser científico ou literário. Barbosa (op. cit) anota que as fronteiras
entre as definições de vocabulário e glossário são muito tênues, pois que há
uma relação de correspondência entre um termo e outro.
O glossário é um recurso útil para
subsidiar o leitor na leitura de textos que contém lexias que podem gerar
lacunas na compreensão plena destes e, por outro lado, como instrumento
lexicográfico auxilia na análise do léxico em uso na época em que o texto foi
produzido, de modo a evitar deslizamento da significação em que determinado
signo foi empregado.
As obras de consulta para elaboração do
glossário foram selecionadas de acordo com a disponibilidade, tanto online quanto física. O Novo Diccionário da Língua Portuguesa de
Cândido de Figueiredo (D.C.F.) é um dicionário cuja primeira edição é de 1899 a
segunda edição, utilizada neste estudo, é de 1913. Antenor Nascentes em artigo
escrito em 1955 mostra que o dicionário de Cândido de Figueiredo:
[...] tem boas
definições, nem sempre figura a pronúncia, traz pouca fraseologia, abona seus
relativamente poucos exemplos indicando a fonte, claudica na parte etimológica.
Entretanto, com todos estes defeitos e mais alguns que seria ocioso apresentar,
é o dicionário por excelência da língua portuguesa. [...] É o mais copioso
dicionário da lingua portuguesa ([1955] 2005).
Ainda sobre este dicionário, Fonseca (1998) nos diz que
Cândido de
Figueiredo escreveu, em 1899, o Novo Dicionário da Língua Portuguesa, bem-vindo
na ocasião, pois veio desbancar o Contemporâneo e o Morais[1].
Na apreciação de Sá Nogueira, é o mais rico, o mais modernizado até então, com
pequenas abonações e etimologias, embora fraco nestas (mas menos que o
Contemporâneo).
Pela legislação atual sobre direitos
autorais, os direitos de cópia desta obra prescreveram, tornando a obra de
domínio público, assim foi digitalizada e integra hoje o Projeto Gutenberg que
tornou-a disponível para consulta e download.
Origem semelhante tem o Grande Diccionario Portuguez ou Thesouro da Lingua
Portugueza de Frei Domingos Vieira, obra de 1871 integralmente digitalizada
por iniciativa da empresa Google Inc.
O Glossário dos Periódicos Humorísticos se
compõe de um inventário de lexias inventariadas em uma amostra de dez jornais
publicados no período entre 1887 e 1908 disponíveis para consulta digital na
hemeroteca da Biblioteca Nacional. Foram jornais pequenos, de baixa tiragem e
dos quais se conhece apenas alguns exemplares, em alguns o exemplar é único.
Nosso objetivo é buscar e identificar lexias
usadas para dar efeito de sentido cômico ao discurso de humor e sarcasmo,
mostrando que algumas transcenderam o tempo e permaneceram no léxico
contemporâneo, outras lexias, no entanto hoje estão em desuso. Para determinarmos
isso, precisou-se consultar a acepção que os lemas possuíam como significação
na época em que foram usados. Percebemos que algumas lexias constituíam neologismos
àquela época, o que mostra também que o léxico não pode ser visto “como uma
listagem estática” (CALÇADA, 1995, p. 853)
O jornal O Veneno, publicado em 1908 traz um artigo que conta a história de
um golpe aplicado em Sorocaba-SP cujo golpista em dado momento vai-se embora
levando consigo certa quantia em dinheiro:
O homem abancára
e tinha com a sua partida provado exhuberantemente que sabia trabalhar... Assim, muitos rodaram na
onda, marcharam com o gajo e elle, “bamboleando airoso as abas do seu fraque”,
lá se foi todo alegrete caminho da Paulicéa (jornal o Veneno, 1908, p. 1).
Uma dificuldade que tivemos na
elaboração desta coletânea foi a acepção que a lexia destacada teria no texto
examinado. Algumas lexias ofereceram maior dificuldade de determinação de
significado, como abancar que no
texto examinado o sentido seria de fugir, contudo nas obras de consulta o
sentido era incongruente. O Grande
Diccionario Portuguez ou Thesouro da Lingua Portugueza de Domingos Vieira
traz a acepção de:
Abancar-se, v. refl. Assentar-se á banca; senta-se
em um banco. Abancar-se como escriptor;
abancar-se na irmandade, sentar-se entre os mezarios nos bancos que lhe são
reservados. Tambem se empresa por: sentar-se
com todo o vagar e á vontade (1871, p. 10).
No dicionário Cândido Figueiredo (1913),
o lema tem o seguinte significado:
Abancar: v. t.
Distribuir por lugares á roda da banca. V. i. Sentar-se á banca.
Na Encyclopedia e Diccionario
Internacional (1935) obtemos a seguinte acepção:
Abancar (de banca), v. tr. Distribuir por logares á roda da banca. | v. intr. e
prep. Assentar-se á banca com intenção de demorar-se.
Abancar (de
banco), v. tr. Guarnecer com bancos: A camara mandou ABANCAR as praças e
jardins publicos. [...]
Nos dicionários de língua portuguesa o
sentido que se procura do referido lema demora a aparecer No Dicionário Escolar
da Língua Portuguesa de Francisco da Silveira Bueno (1957) a acepção e:
abancar, v. t. Dispor em volta da banca; sentar
em banco; int. e p. sentar-se à banca ou à mesa; sentar-se; guarnecer com bancos.
Derivs.: abancado, abancação, abancamento.
O
Dicionário Gallego-Castellano da Real Academia Galega (1913-1928) o lema tem o
significado de:
abancar: 1 tomar la delantera á outro em uma labor
cualquiera; 2 trepar por lós muros ó
paredes de uma huerta para robar lãs frutas,
Essas acepções se repetem em dicionários
da língua galega em anos posteriores. Assim, acreditamos que em um deslizamento
de sentido para um discurso jocoso o lema se aproxima da acepção em que aparece
no contexto de humor do jornal.
No Dicionário Brasileiro Ilustrado
(OLIVEIRA, 1978) as acepções são as seguintes:
ABANCAR, v. v. r. – A + banco + ar. V. t. d. Colocar em torno da banca;
sentar em banco.
ABANCAR, v. int. – Orig. africana. Fugir; correr no encalço de alguém.
O Moderno Dicionário Brasileiro de
Antonio Carlos Barbosa (1979) traz a seguinte acepção:
ABANCAR, v. t.
Dispor em volta da banca; sentar em banco; int. e p. sentar-se à banca ou à
mesa [...]
Entre
as obras consultadas, o Moderno Dicionário Brasileiro, (1983) traz a seguinte
acepção compatível com o sentido empregado no jornal:
ABANCAR, v int. Fugir; correr no encalço de
alguém.
No Dicionário de usos do Português do
Brasil de Francisco S. Borba (2002) constam os seguintes significados:
abancar1 V [Ação] [Compl de lugar] 1 ocupar: Walter Pompeu abancava a meu lado (MEC) [Pronominal] [+ Compl de lugar] 2
sentar-se; instalar-se [...]
abancar2 V [Ação] fugir:Cavalcanti não esclarece se abancou por matreirice [...]
O Novo dicionário Aurélio (2004) traz as
seguintes acepções:
abancar1.
[De a2 + banco1
+ -ar2.] V. t. d. 1. Guarnecer com bancos. Int. P. 2. Tomar assento,
sentar-se, assentar-se.
abancar2.
[De a2 + banca + -ar2.]
V. t. d. 1. Dispor em volta da banca ou da mesa. T. c. 2. Sentar-se ou
assentar-se. [...]
abancar3.
V. int. Correr em fuga, ou no encalço de alguém [ver fugir (1 e 2)] [...]
E finalizando este breve levantamento de
acepções do lema em referência, o Dicionário Houaiss da língua portuguesa
(2001):
1abancar v. (1783
cf. DDP) 1. t.d. Guarnecer de bancos [...]
2abancar v.(1858
cf. MS) 1. t. d. int e pron. Dispor(-se) em torno da banca ou da mesa [...]
3abancar v (a1949
cf. MS) 1. int. correr fugindo de alguma coisa ou perseguindo-a [...] ETIM.
orig.. obsc.; JM levanta, com dúvida, a hipótese de uma origem africana [...].
Ressaltamos que Houaiss assinala a
possível, porém duvidosa, etimologia africana atribuída por José Pedro Machado
(JM).
No jornal O Veneno a lexia ‘abancar’ foi usada em sentido metafórico que se
aproxima da acepção dada pelo dicionário de língua galega, foi a primeira obra
entre as consultadas cujo sentido é conexo com o sentido empregado no jornal,
de modo que consideramos essa lexia um neologismo por empréstimo em 1908 no
país. Assim definido, o lema ainda pode ser classificado como um neologismo
semântico, pois apesar do lema constar em dicionários da época e subsequentes,
no jornal a lexia ganha uma nova conotação.
Para Ullmann (1970) o aspecto emotivo do
significado da palavra depende grandemente do contexto em que é empregada.
Assim sendo, o contexto pode desempenhar papel vital na fixação do significado
das lexias e no caso específico da lexia ‘abancar’ é o contexto quem determina
sua conotação, de modo que o contexto neutraliza o traço de significação
conhecido para instaurar uma nova significação lexical, podendo dar origem ao
neologismo.
As alterações semânticas de uma espécie
estão relacionadas direta ou indiretamente a alterações de espécie diferente
(SAID ALI, 1951, p. 81); dito de outro modo, o domínio semântico de uma lexia
aumenta ou diminui com o aumento ou diminuição do domínio de outro termo. Com
aumento do domínio Said Ali (ibid.)
diz que pode ser quando um termo se sentido especial passa a ter sentido geral.
Processo semelhante se dá com o desuso ou desaparecimento de alguma lexia por
haver outro termo ou expressão tomado seu lugar em decorrência ter sido julgado
mais adequado ou merecido a preferência.
Uma situação conhecida a partir de Bréal
(apud SAID ALI, 1951, p. 83) é a polissemia, quando um termo é usado com
diversas acepções devido à língua não criar lexias com facilidade. A lexia
‘esquálida’ (jornal A opinião, 1897)
aparece no Dicionário de Moraes Silva (1789) como “adj. poer. Sujo. Cam. Lus.
“a barba esquálida”. No Dicionário de
Silva Pinto (1832) como “adj. pea. br.
Sujo, imundo”, mas sem fazer menção de datação. Esta lexia aparece, em nossa
pesquisa, com o sentido empregado no jornal somente em 1957 no dicionário de
Silveira Bueno, quando então passa a ser polissêmica.
O glossário está organizado em forma de
tabela onde pode-se observar o nome do periódico, ano de publicação e os lemas
que foram destacados. Os lemas estão listados abaixo por ordem de ocorrências.
O
Glossário
Jornal A Opinião
- 1897 |
|
Frack – (D.C.F.)
fraque m. Casaco curto, cujas abas se afastam, do peito para baixo. (Do al.
frack). Thesouro
de Antenor Nascentes: FRAQUE — Do al. Frach, casaca, através do fr. frac: Os
franceses chamara Jfi'meíc o que nos chamamos fraque. V. G. Viana, Apost.,
II, 35, Mario Barreto, Novos Estílelos, 317. |
|
Macambusio (D. C. F.) adj. Pop. Carrancudo; embezerrado;
triste. (grafado com ‘z’) |
|
Esquálida (D.C.F.) adj. Sórdido. Desalinhado: “a barba esquálida”. Lusíadas. Carrancudo. (Lat. squalidus) Dic.
Francisco Silveira Bueno – 1957: esqualidez, s. f. Palidez; fraqueza; desalinho; desasseio. (1ª
vez que aparece entre os dicionários consultados com o sentido do texto) |
|
Turumba (D.C.F.) turumbamba m. Bras. do N. Altercação. Desordem, balbúrdia. |
|
Z.B.D.E.U. refere-se a
zébedeu. Embora seja um nome bíblico, era o pai de João e Tiago (Mateus
10:2), tem a acepção popular de “ individuo que não entende direito o
que se comenta para ele sobre um determinado assunto; de difícil compreensão;
burro. Também se define como um individuo sem futuro ou sem ação;
abestalhado, palerma.” (Dic. Informal- www.dicionarioinformal.com.br) |
|
Gatuno (Dic. Rafael
Bluteau) termo de chularia. Velhacão, tonate.(D.C.F.) m e adj. Vadio;
larápio; ratoneiro. |
|
Pato (D.C.F.) m. [...] Chul. Idiota, parvo. |
|
O jagunço –
1903 |
|
Cabuloso (D.C.F.) adj.
Bras. O mesmo que manhoso. No
texto aparece com a acepção de desagrado e antipatia, acepção contemplada
somente no Dic.
Houaiss: 3 desagradável, antipático |
|
Xilindró (D.C.F.) m. chul. Outra forma de chilindró. m. Pop. Estação policial; calaboiço. |
|
Jornal O
Veneno – 1908 |
|
Art nouveau: Arquitetura,
estilo internacional de arquitetura e arte decorativa de influência
geométrica em voga entre 1890 e 1910. |
Lectrizes e
ledores
(D.C.F.) ledor m. e adj. O que lê (Lat. lector). Logo, lectriz seria o feminino de lector.(Nota do autor) |
Chronique: do francês,
significa ‘crônico’, usado no texto pela semelhança morfológica com o lema ‘crônica’. |
Arame (D.C.F.) Bras. Chul. O mesmo que dinheiro. |
Roxura do
porco
(D. Houaiss) s.f. 1 m.q. roxidão ('cor') 2
fig. situação difícil; aperto, contratempo 3 fig. desejo
intenso; ânsia, excitação 4 fig. o que causa prazer,
satisfação; delícia etim roxo
+ -ura |
|
Grude: na acepção
de alimento (comida) Dic.
Antonio Moraes Silva (1789) diz que o grude é substância “extraída dos coiros
dos animaes bem cosidos; colla; de buxos de alguns peixes”. De onde podemos
supor a origem de se associar “grude” a alimento. (Dic
Franc Silv Bueno 1957): s.m. Cola; massa usada na fabricação do calçado;
(Bras.) refeição; comida. D.
Houaiss: 11 B infrm. joc. alimento, comida, esp. a ordinária
ou a comum; bóia <o g. estava à mesa>. |
|
Fanfulla – graça de um
personagem histórico, herói nacional da Itália, que foi combatente de Lodi,
comuna italiana que fica na região da Lombardia – fonte: jornal Fanfulla. http://www.jornalfanfulla.com/paginas.asp?categoria=o-jornal |
Violonomaníaco (Dic.
Houaiss): “maníaco: el.comp. pospositivo, formador de adjetivos e
agentes de -mania 'loucura, demência' (ver), cujos comp. em
princípio têm der. com este el.”. Comporta a abertura para casos ocasionais
como este em referência. |
Cabuloso (D.C.F.) adj.
Bras. O mesmo que manhoso. Não na
acepção de algo obscuro, como no texto. Dic.
Houaiss: 4 complicado, obscuro. |
|
Coió (D.C.F.) 1
adj. T. de Gaia. Ordinário, reles,
que não presta para nada. |
|
O Badalo –
1897 |
|
Cocotes: (D.C.F.) f. Neol. Papel de côr,
atado em fórma de boneca de envernizador, e que, contendo papelinhos e areia,
ou outros objectos, se emprega como
projéctil em folguedos do Carnaval. Chamamos
a atenção para esta acepção não recuperada no Dicionário Houaiss. O
jornal onde aparece esta lexia foi publicado no período de carnaval. |
|
Bilontras: (D.C.F.) m. Velhaco. Espertalhão. Bras. Homem
desprezível, que frequenta lupanares e más companhias. |
|
Calomelanos> (Dic.
Houais) s.m. (1695 cf. CSPMed) farm
cloreto mercuroso (Hg2Cl2) us. como purgativo,
anti-sifilítico e como elétrodo de referência (mais us. no pl.);
dragão-amansado, protocloreto de mercúrio etim
cal(i/o)- + -melano |
|
Cachexia: (D.C.F.) f.
fraqueza geral do organismo. Abatimento senil. (Gr. kakhexia) |
|
Labregos: (Dic. De
Usos): indivíduo grosseiro. (Dic.
Franc Silv Bueno- 1957): adj e s. m. Rústico; aldeão (fig); malcriado;
grosseiro; s. m. antiga alcunha de portugueses; galego; s. m. espécie de
arado [...]. (Dic.
Enciclopedico chama de brasileirismo) |
|
Trotoir: do francês
(Dic Houaiss) substantivo masculino 1 calçada de rua; passeio 2 a prostituição, esp. de quem usa
as ruas para o aliciamento de clientes |
|
Adresse: do francês: endereço |
|
Ramalhudos adj. Que tem muita
ramagem. Dividido em muitos ramos. Fig. Que tem muitas phrases e
poucas ideias. Que ramalha. Que tem pestanas longas e bastas, (falando-se dos
olhos). (De ramalho)( O Léxico é um dicionário
online de português com mais de 320.000 palavras registadas. http://www.lexico.pt/) (Dic
Enciclopedico) : adj. Que tem muita rama [...] fig Que tem muitas
palavras e frases e poucas ideias. |
|
Paquete (packet –
navio) |
|
O Bilontra –
1887 |
|
Urbi et orbe: grafa-se com
‘i’ (urbi et orbi) significa “à cidade de Roma e ao mundo” é a benção de
Páscoa e Natal proferida pelo Papa ao público da praça de São Pedro. |
Bilontragem (definido
pelo próprio jornal) bilontragem para nós é synonimo de gracejar, rir, e
fazer cócegas naquelles que forem circumspectos e taciturnos. (D.C.F.)
f. Procedimento de bilontra. Súcia
de bilontras. |
Tou à fait
chic:
do francês, grafa-se tout á fait chihc, significa ‘tudo muito chique’. |
Crocodiláceos: no texto tem
a acepção de olhos fixos de conquistador amoroso. |
Mignon: do francês
(Dic Houaiss) adjetivo 1
elegante, harmonioso, de tamanho pequeno e ao mesmo tempo delicado
apositivo e substantivo masculino Rubrica:
artes gráficas. Diacronismo: antigo. 2
m.q. miúdo |
Pindahyba (D.C.F.)
pindaíba f. Corda, feita de palha
de coqueiro; ibira. Bras., gír. de
estudantes. Falta de dinheiro. |
Zé-povinho: pessoa
curiosa e fofoqueira; pessoa maledicente e mentirosa.
(http://www.dicionarioinformal.com.br/z%C3%A9-povinho/) |
|
Zé-Pereira: personagem
de carnaval; forma de diversão de grupo de foliões tocando bumbos e desfilando em parada. Há
uma marchinha carnavalesca que ilustra o personagem: E viva o Zé Pereira/
pois a ninguém faz mal/ E viva a bebedeira/ Nos dias de Carnaval. (Nota
do autor baseada em MORAES, Eneida de. História do carnaval carioca. Rio de Janeiro: Record, 1987 |
|
Chinga (D.C.F.)
xingar v. t. Bras. Insultar com
palavras. V. i. Zombar. (do quimb.) |
|
Famélico fisco: Fisco é um
termo que se refere ao gestor do Tesouro público em nome do Estado; parte da
administração pública encarregada de cobrar os impostos. (Nota do autor) |
|
Zé-Caipora: primeiro
personagem nacional dos quadrinhos no país, de Angelo Agostini (As Aventuras de Nhô-Quim & Zé Caipora:
os primeiros quadrinhos brasileiros 1869-1883. de Athos Eichler Cardoso.
Brasiília-DF: Edit. do Senado Federal, 2000) |
|
O Canudo –
1897 |
|
Moralgia
inter-costal:
o sufixo algia é um termo técnico
da área da saúde e significa dor; é
acompanhado de um radical que designa a região do corpo acometida pela dor.
Tem sentido figurado, algo como um sofrimento moral que recai sobre as costas
ou consciência de alguém. |
|
Sexo barbado: o gênero
masculino |
|
Bondecídio: ‘cídio’:sufixo nominal de origem
latina, que ocorre em substantivos e exprime a ideia de morte ou
extermínio. O efeito de humor
está no texto que se refere ao atropelamento de um gato por um bonde
tracionado a cavalo, e que cujo cocheiro teria sido preso pelo tal ato. (nota
do autor, baseado em: -cídio in Dicionário da Língua Portuguesa com Acordo
Ortográfico [em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2014. [consult. 2014-12-09
13:38:30]. Disponível em: http://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/-cídio) |
|
Sportsmen: do inglês,
esportistas.. |
|
Verve: do francês,
(Dic. Houaiss) substantivo feminino 1
entusiasmo e inspiração que animam a criação e o desempenho do artista, do
orador, do poeta Ex.:
a v. de Picasso e de suas obras 2
Derivação: por extensão de sentido. graça
ou vivacidade que caracterizam uma personalidade, ou o que ela produz Ex.:
<ela tem muita v.> <a v. de suas anedotas> 3
Derivação: sentido figurado. sentimento
de vida, vitalidade Ex.:
anda desanimado, sem v. |
|
Pélla (um jogo) |
|
Bonets: boné |
|
O Urubú – 1896 |
|
Proboscidas: (D.C.F.)
probo m. que tem carácter integro;
justo; honrado; recto (Lat. probus);
no texto há o acréscimo do sufixo nominal de
origem latina, que ocorre em substantivos e exprime a ideia de morte ou
extermínio; o efeito de humor
está em alguém que mate ou extermine a integridade, justeza e honradez no
reinado de Momo (período do carnaval). |
|
Treé chic: do francês
ser chique. |
|
Dangereuse en
amours:
do francês, amor perigoso. No texto tema acepção de conquistador. |
|
Rendez-vouz: do francês,
(Dic. Houaiss) substantivo masculino 1 ponto de encontro; local
escolhido para entrevista, conversa etc. 2 (1877) encontro
combinado de antemão 3 ver randevu 4 Rubrica: astrofísica. encontro
de dois ou mais engenhos espaciais .
No Btasil com a grafia ‘randevu’ tem a acepção de casa
de prostituição; bordel, prostíbulo, rendez-vous |
|
Derby: do inglês,
(Dic Houaiss) substantivo masculino. Rubrica de esportes. Regionalismo: São
Paulo. jogo,
partida ou competição esportiva de grande destaque (como o Derby de Epson, na
Inglaterra) atualmente
é o confronto entre dois clubes rivais de uma mesma cidade, o mesmo que
"clássico" |
|
A tesoura –
1895 |
|
Pessoal
Quadrupedante:
no texto refere-se a cavalos para tração de bondes, expressão para efeito
cômico. |
|
Pantagruélicamente:
(D.C.F.) pantagruelismo m. Espécie de philosophia epicurista.
Systema dos que se preocupam exclusivamente dos gozos mate riais
da vida. |
|
Caratonha (Dic. Moraes
Silva – 1789) carantonha: s.f Cara feya. § Mascara. Fazer carantonhas: medo. |
|
Pindahyba (D.C.F.)
pindaíba f. Corda, feita de palha
de coqueiro; ibira. Bras., gír. de
estudantes. Falta de dinheiro |
|
Está bom,
deixa... – 1903 |
|
Carnuzidade: no texto é um
termo elogioso chulo à beleza de uma mulher. |
|
Talagada: (Dic.
Houaiss): s.f. regionalismo: Brasil Uso informal. Gole de bebida alcoólica
que se toma de uma vez. Neste dicionário a datação é sXX cf.Antonio Geraldo
Cunha. |
|
O Trabuco –
1900 |
|
Pirrimpinpado: lexia não
consta nos dicionários consultados. No
texto a lexia tem o sentido de que ou quem é muito vaidoso, também
elegantemente trajado. |
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Afuncamento: (D.C.F.) funca: m., f.
adj. Pessoa, ou coisa de pouco préstimo. ((D.
Houaiss): funca: Regionalismo: São Paulo. 1. Uso: informal. pessoa ou
coisa sem valor, utilidade ou préstimo adjetivo de dois gêneros 2. de
caráter ruim; mau. Apesar
de constar como regionalismo paulista, localizou-se duas ocorrências da forma
reflexiva afuncar-se em jornais do Ceará. (O trabuco e O
libertador edição de 19.dez.1884) |
Fonte: pesquisa do autor
O propósito principal deste texto foi o
de apresentar um glossário construído a partir de uma amostra de jornais de
humor do final do século XIX e início do século XX. A linguagem nos periódicos
de humor era articulada sem o controle característico dos periódicos de grande
circulação quanto ao formato, assunto abordado e o modo de abordagem. Embora
não se tenha feito uma comparação direta, acredita-se que a ocorrência de
estrangeirismos e neologismos seja mais frequente nos periódicos de humor
devido ao seu modo iminentemente coloquial de redação que se pode notar nestes
periódicos.
Pôde-se notar também que na ocorrência
de estrangeirismos há uma crescente mudança de preferência de palavras
francesas para inglesas. As diversas categorias antes rotuladas com lexias
francesas passam aos poucos a serem rotuladas com lexias da língua inglesa e
ganham cada vez mais espaço na cultura nacional. Os critérios de classificação
de objetos são diretamente ligados ao efeito de humor pretendido e ao impacto
que pode causar no leitor; os modismos também constituem fatores relevantes no
léxico. A influência das novas modalidades esportivas importadas e o comércio
os com países de língua inglesa podem ter sido determinantes para a mudança,
levando o “falar francês” a deixar de ser três
chic e o “falar inglês” ser um must.
Entre as diversas lexias listadas estão
elementos neológicos que decorrente da aceitação da sociedade permaneceram e
ainda podem ser observadas ocorrências de uso efetivo. Por outro lado há
elementos lexicais que no período pesquisado eram neologismos, o lexicógrafo
incluiu as lexias em dicionário, mas que caíram em desuso e hoje podem ser
considerados arcaísmos, é o caso de bilontra.
Há questões que devem ser observadas
como as ocorrências de produção neologística baseada em processos de sufixação
ou prefixação. O sufixo nominal latino “cídio” que ocorre em substantivos para
exprimir a ideia de morte ou extermínio foi o mais observado nos periódicos que
fizeram parte de nosso corpus.
Por fim, os periódicos humorísticos
analisados marcaram o discurso jornalístico da época pela crítica viva aos
costumes, a política aparece em alguns momentos, mas não como mote principal.
Esperamos ter contribuído para tirar do
esquecimento periódicos que de algum modo marcaram a imprensa nacional e
possivelmente ter contribuído para os estudos do léxico.
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[1] Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa de António Lopes dos Santos Valente e prefácio de Carlos Aulete (1881); Dicionário da Língua Portuguesa de António de Morais Silva (1789)
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